segunda-feira, 23 de maio de 2011

Ozana

Ozana no jardim de sua casa,
em Londrina, anos 90.

No dia 25 de abril passado a cabeleireira Ozana Arruda morreu no Hospital do Coração, em Londrina, Norte do Paraná, depois de dois dias internada na UTI e de ter sofrido um enfarte e 7 paradas cardíacas.

Ela tinha 84 anos, nasceu em São Joaquim da Barra, Estado de São Paulo, e desde pequena já trabalhava na roça, ajudando seus pais no plantio de milho, café, hortaliças, montando cavalos e guiando charretes, em Jaguapitã, Paraná. Era apaixonada por plantas, sabia como cultivá-las e sempre teve em sua casa muitos vasos e jardins, com as mais diversas espécies de flores, folhagens, árvores, etc.


Ozana no Rio Cristina, em Barra
do Una em jan de 2008

Em minha casa, no Sertão de Barra do Una, São Sebastião, litoral norte de São Paulo, onde Ozana esteve por várias vezes, ela levava e plantava mudas que se tornaram grandes árvores e folhagens, que estão hoje embelezando o jardim. Por onde passo vejo seus rastros.

Ozana casou se com Chicão e teve 4 filhos: Rose, Roldão, Carlos e João, e todos abraçaram a profissão de jornalista. Sua origem humilde não lhe permitiu estudar na infância e juventude, de modo que, somente depois que os filhos estavam criados, ela decidiu ir a escola e se alfabetizar. Há alguns anos passou a frequentar aulas de natação, já com idade acima de 70 anos, e sempre que podia mostrava seus dotes de nadadora nas piscinas, rios e praias onde passava.

                                                                                                                                                 
Ozana, de pe´, à direita, em seu salão,
anos 60, Jaguapitã -PR

Mas, o que ela gostava mesmo era de trabalhar. Eita mulher laboriosa. Foi com o seu trabalho como cabeleireira que ajudou o marido e encaminhou os filhos. Até seus últimos dias Ozana mantinha uma pequena frequesia, que tinha a mesma média de idade que a sua e para a qual fazia cabelo, mãos e pés. Eu mesmo fui seu cliente, algumas vezes. Mas, é claro que, para a família, ela não cobrava. Se tinha uma coisa que Ozana não entendia era de dinheiro. Não sabia cobrar e nem ganhar dinheiro.


Ozana na cozinha da casa do filho
João, natal de 2007, Londrina PR

Outro ponto eram seus dotes culinários. Ela adorava cozinhar, fazer muitos pratos e dos mais diversos tipos. Nalgumas vezes que eu a visitava, tinha lá uma feijoada me esperando, por deferência pessoal. Fazia também um bom frango recheado, farofa, saladas e outras delícias que só de lembrar me dão água na boca. No começo do ano tive vontade de comer uma polenta com molho de tomate, prato bem simples, e toca eu então a ligar para a Ozana para ela me ensinar como se preparava uma deliciosa polenta.

Nos últimos dez anos Ozana também realizou, na sua melhor idade, um sonho que acalentava desde moça, que era cantar em coral. Escolheu logo ir cantar no Coral de Santa Cecília, da Catedral Metropolitana de Londrina. Todos os domingos, na missa das 10:30 da manhã, estava lá Ozana cantando na Catedral, com direito à transmissão pela rádio católica da cidade.

O prefeito de Londrina decretou luto oficial de 3 (três) dias quando ela morreu. Houve também um discurso na Assembléia Legislativa do Paraná, homenageando sua memória, e a publicação de um voto de pesar no Diário da Camara Federal. Até o prefeito de Curitiba enviou condolências à família. Os jornais de Londrina publicaram notas do seu falecimento, e um deles deu espaço para uma nota especial intitulada "Ozana nas alturas!". Passaram pelo seu velório centenas de pessoas, amigos, muitos profissionais de imprensa, deputados, vereadores, ex prefeitos, ex senadores, etc. Todos os porteiros do prédio onde morava foram dar adeus à Dona Ozana, que diariamente os presenteava com pratos de refeição, lanches e café. O cortejo fúnebre era longo e ocupou alguns quarteirões com vários carros enfileirados.

Embora tivesse uma vida simples, sem qualquer papel significativo no cenário político, e tampouco era uma celebridade, a morte de Ozana causou muita comoção. Isto por que Ozana, ou Dona Ozana, como era mais conhecida, virou unanimidade para todos que a conheciam. Uma pessoa generosa, doce, meiga. A casa dos Arruda desde cedo virou ponto de encontro dos amigos de seus filhos, gente de grupos de teatro amador e do movimento estudantil, fila bóia, que gostava do tempero da Ozana, ou que que sequer  tinha dinheiro para pagar almoço. E, todos eram sempre benvindos.



Visita a Aparecida
do Norte, em 2003. Ozana à
esquerda, ao lado de Eduardo
e D. Maria.




  Eu mesmo fui entrando devagarinho no seu coração, até que consegui o título vitalício e remido de "agregado" da família. Contava com uma arma secreta para seduzí-la, que era de acompanhá-la para visitar o Santuário de Nossa Senhora Aparecida, nas vezes que vinha para São Paulo.  Cheguei também a lhe enviar pelo correio várias fitinhas de pulso com o nome da padroeira do Brasil. E assim deu certo! Ela está fazendo uma falta danada.





Quadro "Ozana" - Lucas Arruda
maio 2011,  I 20 Gallery NY.
Na próxima quarta feira, 25 de maio, quando completará um mês de falecimento de Ozana, o jovem pintor Lucas Arruda abrirá uma mostra individual na I-20 Gallery em Nova York e renderá uma homenagem à avó, intitulando de Ozana uma de suas obras. As demais obras não terão títulos.


Ninguém resiste a lhe prestar um tributo. Este relato é uma pequena homenagem que faço à Ozana, em reconhecimento e agradecimento por todas as coisas que ela fez e deixou, que me ajudaram a ser mais feliz. Ozana nas alturas!