terça-feira, 24 de agosto de 2010

Os pecados e as opções de Plínio, Serra e Marina.

Plínio diz que homossexualidade é pecado, um erro.

Uma das minhas grandes diferenças com algumas pessoas de igrejas e religiões é que elas têm a viva arrogância e firme convicção de chamar para si o papel quase que exclusivo de intermediação e de interpretação das palavras, pensamentos e até sentimentos de Deus, não admitindo concorrência neste mercado, que não tem crise de clientes.

Não é a toa que o papa é chamado de pontífice, pois ele faria a ponte entre os Homens e Deus. Assim, também, nas revelações divinas recebidas por bispos, pastores, apóstolos e outros "escolhidos", há sempre uma situação cômoda de privilégio daquele "intermediário". Ele é quem sempre dá a  última palavra: Deus disse isto, Deus quer aquilo, Deus não gosta daquiloutro, ainda que tudo seja fruto da  sua imaginação, tão somente. Afinal, quem tem coragem de contestar a vontade ou a palavra de Deus?

Daí, o charlatanismo, a safadeza e o enriquecimento ilícito à custa da boa fé do povo ficam tão perto, e não se pode, e nem se consegue, separar o joio do trigo. Os intérpretes de Deus, ou os seus representantes na terra, escolhidos e iluminados, usam e abusam sexualmente de crianças, protegidos pela cumplicidade criminosa e episcopal. Estelionato, bíblias recheadas de dólares nas alfândegas, e até lavagem de dinheiro são práticas corriqueiras neste mundo que ignora Deus, mas fatura alto usando seu santo nome, em vão.

É obvio que não são todos assim. Mas, na hora que se fala de orientação sexual, até o trigo vira joio.


É por esta razão que não é nada fácil para gays (LGBTs) ter que lutar e afirmar sua individualidade, personalidade, orientação sexual, tendo sempre como opositores pessoas que resistem em reconhecer e respeitar os direitos fundamentais, em especial o da dignidade da pessoa humana. Pessoas que insistem em dizer que a homossexualidade é contra a vontade de Deus, e portanto se constitui em pecado.

Nesta luta cotidiana de buscar um lugar ao sol da cidadania e do respeito aos direitos humanos, para quem se entusiasmou com o beijo gay no programa eleitoral do PSOL, aqui vai um recado que vale a pena levar em conta: o candidato daquele partido à presidência da República, o católico Plínio de Arruda Sampaio considera a homossexualidade “um pecado, um erro”. Ele fez essa afirmação durante o debate realizado na segunda-feira à noite, 24.08.10, e transmitido pelas emissoras católicas Canção Nova e Rede Aparecida. A candidata Marina Silva, do PV, também usou a palavra “pecado” ao se referir ao assunto. A petista Dilma Rousseff, que lidera disparada as pesquisas de intenção voto, não compareceu ao debate.

Um dos entrevistadores quis saber o que os candidatos achavam sobre o projeto de lei, que está no Congresso, que criminaliza a homofobia. Segundo o entrevistador, que estava ali para defender o ponto de vista das igrejas, o projeto quer “impedir os cristãos de manifestarem o livre pensamento de sua religião sobre o assunto”, ou seja a homossexualidade.

Usando a expressão “opção sexual” para se referir à homossexualidade, Plínio disse que não leu o projeto e respondeu de forma genérica:

"Sou contra qualquer forma de desigualdade e discriminação. Mas, essa parte de proibir os cristãos de dizerem o que pensam, dentro da nossa fé, não aceito. Eu não aceito que nós cristãos não possamos dizer que isso é um pecado, um erro. Isso é uma coisa. Outra coisa é perseguir, mexer, humilhar. Não se pode humilhar uma pessoa por causa da sua opção sexual.”
O candidato do PSDB, José Serra, que disse também não ter lido o projeto, referiu-se à homossexualidade como “preferência” sexual. Eis o que ele respondeu:

“Acredito que a questão da preferência sexual não pode ser objeto de discriminação, perseguição, humilhação, como disse o Plínio. Que as religiões tenham determinados princípios, crenças em relação a essa questão é perfeitamente normal, compreensível. Eles têm o direito de considerar que dentro de sua igreja deve-se pregar contra o homossexualismo, contra coisas que correspondem à sua fé, sua interpretação da fé. Não li o projeto. A minha preocupação é saber onde começa e até onde chega. Ele não pode proibir uma manifestação dentro de uma igreja.”

Mais adiante Serra acrescentou: “No Brasil tem até esquadrões para matar torturar, ou simplesmente agredir pessoas que tem preferências sexuais por quem é do mesmo sexo. É uma barbaridade. Isso é crime. Que uma religião não aceite a idéia do homossexualismo, que considere que deve pregar contra essa prática para seus fiéis é uma coisa, outra é a questão social que está envolvida, a questão da discriminação e até da violência.”


A candidata do PV, que é evangélica, não foi indagada diretamente sobre o tema. Mas procurou abordá-lo em outro momento, quando falava sobre a satanização que ocorre nos debates sobre aborto, homossexualidade e outros temas ligados a fé e comportamento. Ela disse: “Jesus sempre tinha uma forma de tratar com esses temas. Ele dizia: ‘vocês dizem que é assim e assado do ponto de vista religioso, eu, porém vos digo...’ Fico pensando qual seria o ‘eu, porém, vos digo’, em relação aos homossexuais. As igrejas tem o direito de se posicionarem, dizendo o que é pecado. No entanto, temos que ter um olhar de respeito. Ninguém pode exigir como parte da sua preleção o direito de humilhar e discriminar quem quer que seja e eu sei que não é isso que os padres e pastores estão reivindicando.”

Não sei aí quem é pior, se são os intérpretes de Deus, ou os candidatos Plínio, Serra e Marina. Não é implicância minha, mas faltou alguém falar no debate sobre direitos civis, direitos humanos, pois os discursos pautaram-se sempre na idéia de tratar os LGBT como "coitadinhos deles". "O que eles fazem, por OPÇÃO própria, é pecado. Mas, como nós somos "escolhidos" (e aí pode ser escolhido por Deus ou pelo voto), não vamos deixar que batam neles."

Faltou esclarecer que para ser Presidente da República não se pode transigir sobre certos assuntos, como moralidade pública - não roubar, racismo - não permitir qualquer discriminação em razão da cor da pele, sexismo - tratar igualmente homens e mulheres e homofobia - não permitir qualquer discriminação em razão da orientação sexual, inclusive a divulgação da idéia que homossexualidade é pecado).

Não sou um iluminado, nem escolhido, nem tive qualquer revelação, e tempouco vivo de dízimo. Diferentemente das Igrejas, não tenho isenção fiscal.  Mas, interpreto e sei bem identificar a homofobia embutida nas perguntas dos "escolhidos de Deus" e um compromisso frouxo e desinteressado, assumido pelos três candidatos, com o respeito aos direitos humanos de gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transgêneros e transexuais.


Este debate me ajudou a decidir que não irei votar em nenhum dos três. Eles que fiquem com suas idéias de pecados e de opções. Eu quero para presidente quem tenha idéias e compromissos firmes de direitos humanos, de igualdade, de não descriminação, de não violência e de não preconceito. E que tenha coragem de dizer isto claramente, em alto e bom tom.