quarta-feira, 25 de abril de 2012

Cotas raciais enriquecem universidades

Acaba de ser publicado no blog do jornalista Roldão Arruda (clique aqui para ler diretamente no blog)  um artigo de Hedio Silva Jr., defendendo as cotas raciais para universidades públicas, cuja constitucionaldiade será julgada  hoje pelo STF. Recomendo a leitura honesta e clara de que cotas sempre existiram na adoção de políticas públicas no Brasil, porém tratando-se de cotas raciais surgiram várias contestações e oposições que revelam o racismo colérico de alguns segmentos.

“Cotas enriquecem universidades”

Hédio Silva Jr., doutorado pela PUC-SP,  já foi secretário de governo no Estado de São Paulo e atualmente atua como diretor acadêmico da Faculdade Zumbi dos Palmares e também do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades. 

“No início do governo Getúlio, em 1931, o Brasil aprovava a primeira lei de cotas de que se tem notícia nas Américas: a Lei da Nacionalização do Trabalho, ainda hoje presente na CLT, que determina que dois terços dos trabalhadores das empresas sejam nacionais.
Com o surgimento da Justiça do Trabalho, também naquele período, o Direito do Trabalho inaugurava uma modalidade de ação afirmativa que até hoje considera o empregado um hipossuficiente, favorecendo-o na defesa judicial dos seus direitos.
Em 1968, o Congresso instituía cotas nas universidades, por meio da chamada Lei do Boi, cujo artigo primeiro prescrevia: “Os estabelecimentos de ensino médio agrícola e as escolas superiores de Agricultura e Veterinária, mantidos pela União, reservarão, anualmente, de preferência, de 50% (cinquenta por cento) de suas vagas a candidatos agricultores ou filhos destes, proprietários ou não de terras, que residam com suas famílias na zona rural e 30% (trinta por cento) a agricultores ou filhos destes, proprietários ou não de terras, que residam em cidades ou vilas que não possuam estabelecimentos de ensino médio”.
Na vigência da Constituição de 1988, o país adotou cotas para portadores de deficiência no setor público e privado, cotas para mulheres nas candidaturas partidárias e instituiu uma modalidade de ação afirmativa em favor do consumidor: dada a presunção de que fornecedores e consumidores ocupam posições materialmente desiguais, estes últimos são beneficiados com a inversão do ônus da prova em seu favor, de modo que em certas hipóteses ao fornecedor cabe provar que ofereceu um produto em condições de ser consumido.
Dois registros: 1. o Brasil poderia tranquilamente orgulhar-se de exibir cotas e outras políticas de ação afirmativa como um produto genuinamente nacional; 2. não é mera casualidade o fato de jamais ter havido qualquer questionamento quanto à adoção de cotas para quaisquer outros segmentos, mas, no momento em que este mesmo princípio jurídico passa a ser invocado para favorecer a população negra, emerge uma oposição colérica e incapaz de enfrentar o contraditório, o debate público, aberto.
Doze anos depois da implantação de ações afirmativas para o acesso de jovens negros e brancos pobres ao ensino superior, os dados falam por si: os alunos cotistas apresentam o mesmo desempenho de seus colegas; as universidades ganharam em criatividade e desempenho e não há registro de incidente mais sério, a não ser velhas manifestações de intolerância que datam desde a chegada de Cabral. No mais, há dez documentos públicos nos quais os brasileiros são classificados racialmente desde tempos imemoriais, funcionando muito bem obrigado até a classificação racial ser invocada para a fruição – e não a violação – de direitos.
Ao julgar a constitucionalidade das ações afirmativas o STF tem em mãos mais uma oportunidade de reafirmar a esperança que os indivíduos devem ter em relação a um dos pilares do funcionamento da Justiça: a interpretação dos textos e dos fatos deve ter como base a norma jurídica, o direito, não podendo ser circunscrita aos valores e credos pessoais. As normas são, presumivelmente, boas para todos; ao passo que valores quase sempre são bons apenas para nós.”