terça-feira, 9 de setembro de 2014

WILL


Na madrugada de domingo para segunda feira, 08.09.2014, morreu William Aguiar no hospital Paulistano, na Capital de São Paulo. Ele era meu amigo há quase uma década e meia, e eu gostava muito dele.  Era teimoso demais e só fazia o que queria, sendo que por vezes dava vontade de lhe dar uns tapas, mas ele era assim mesmo e não tinha quem o mudasse, nem o calasse.

Era sensível e solidário. Não consigo dizer muito mais coisas sobre ele neste momento, mas estou reproduzindo abaixo pequenos depoimentos de amigos e parentes que confirmam que William era uma pessoa doce, e um ativista político defensor dos direitos humanos aguerrido, combativo e sempre indignado.


William também gostava de uma galhofa, de falar bobagens e coisas muito engraçadas. Quando se inspirava no besteirol, costumava se apresentar com o nome de “Maria de Fátima Goreth”, um alter ego da sua viadagem vaidosa e devassa.


Com vocês: William Aguiar ou  simplesmente Maria de Fátima Goreth


Roldão Arruda – 08.09.2014

William foi cremado ontem pela manhã em São Paulo. A mãe vai levar as cinzas para Belém, a cidade onde ele nasceu, há cinquenta anos.
William lutava contra um câncer. No final da tarde de domingo, no hospital, a médica comunicou-lhe que não havia mais nada a fazer. Também disse, pouco antes de sair do quarto, que iria deixar tudo pronto para que ele fosse sedado. Só iriam fazê-lo, no entanto, quando pedisse.
William recebeu em seguida a visita de dois velhos amigos. Conversaram até que a dor não permitiu mais. Então ele pediu licença aos dois, chamou o enfermeiro e autorizou a sedação. Morreu menos de três horas depois.


Naquela última conversa, ele ainda se lembrou de mandar um abraço para mim. Fazia isso sempre que encontrava algum amigo comum, desde o início da década de 1990. Foi quando o conheci. Eu escrevia sobre comportamento e ele atuava no setorial LGBT do PT - o que era uma super novidade na época.
William foi uma importante fonte de informações durante anos. Depois ele deixou São Paulo e eu mudei de área de cobertura, mas nunca perdemos o contato. Ultimamente era aqui pelo Facebook, onde, no dia 3 de agosto, indignado com o avanço da doença, ele postou essa pérola do Tropicália.




Acho que sua maior virtude era a indignação. Contra qualquer tipo de injustiça. Logo no nosso primeiro contato ele estava indignado contra a reação de setores mais tradicionais do PT à criação de um setorial LGBT.
Ele e sua santa indignação vão fazer falta.


Julian Rodrigues – 08.09.2014

Muito triste. Faleceu essa madrugada, em São Paulo, o Willian Aguiar, que vinha, nos últimos tempos, lutando contra um câncer.
Willian Aguiar era uma pessoa muito querida.
Ele foi minha primeira referência sobre LGBT no PT
Foi um dos fundadores do Núcleo LGBT, em São Paulo, na época, Núcleo de Gays e Lésbicas, no início dos anos 1990.
Ele escrevia no jornal EM TEMPO, da DS, artigos maravilhosos, que eu sempre lia, quando era estudante universitário em MG e ativista do Movimento Estudantil. Willian foi um dos organizadores dos 13 pontos do PT na eleição de 1994, de Lula e Zé Dirceu. Ele sempre contava, com aquela ira santa que o caracterizava, que os panfletos só saíram depois das eleições, estavam estocados em algum depósito.

Quando me mudei pra SP, no final dos anos 1990, pude conhecê-lo pessoalmente, colaborando com a Sonia Hypolito, na Secretaria Nacional de Movimentos Populares, precursora da organização de todos nossos setoriais.
Depois Willian ficou um tempo na Europa, e, no início dos anos 2000, voltou ao Brasil. Soropositivo, morou uma época em Belém, depois, em São Paulo, novamente,quando pudemos estreitar nossa relação. Militamos juntos no Instituto Edson Neri, junto com Beto de Jesus e Eduardo Piza.
Depois, como ótimo jornalista que era, foi para Brasília, onde estava morando. Nos últimos, infelizmente, sua saúde vinha se deteriorando.
Andava também, há anos, muito bravo com os vacilos do PT, que não deixava de criticar veementemente. Mas, nunca cogitou , que eu saiba, deixar nosso Partido.
Se não me falha a memória, a última vez que estive com ele foi no final de 2011, na II Conferência Nacional LGBT.
Acho que o Willian deveria ser homenageado no nosso ato do dia 20. Ele ficaria satisfeito em ver esse verdadeiro reencontro do governo e do PT com nossa pauta. Com certeza, estaria lá, com sua garra e combatividade.
Vá em paz, amigo.
Willian Aguiar, presente!



Beto de Jesus – 08.09.2014 


Amigxs queridxs! É com muita tristeza que comunico a vocês o falecimento do William Aguiar meu querido amigo e de muitxs de vcs aqui. William vinha lutando bravamente contra um câncer na região pelvica nos ultimos meses e por volta da 0:50 hs de hoje fez sua passagem e acabou com todo o sofrimento que estava submetido. Tive o prazer de ser muito intimo dele e dividir muitas coisas da vida e quis Deus que ontem juntamente com Eduardo Piza Mello fossemos visita-lo a noite no hospital e poder falar com ele e nos despedirmos. Ele me olhou nos olhos e me disse: "Meu irmão, essa visita é a nossa despedida!" E assim foi. Ajudei-o a acomodar-se na cama e nos despedimos. Tenho hoje no meu coração e nas minhas orações sua mãe Marilea e sua irmã Olivia Aguiar, duas mulheres muito especiais que tive o prazer de conhecer. Ao meu amado irmão, agradeço por nossa amizade, intimidade e cumplicidade e por todos os ensinamentos. Descanse em paz! Tão logo tenhamos mais informações sobre o velório eu comunicarei,



Vitória Aguiar – 08.09.2014 

Padrinhos são pais espirituais, que tem como função ajudar o seu afilhado no caminho da fé Cristã. E meu dindo cumpriu o seu papel em minha vida magnificamente, que apesar da distancia estava ligado de uma forma muito forte em meu coração. E hoje só peço para que Deus cuide muito bem do senhor, que seja bem recebido com muita festa ai no Céu, pois foi uma pessoa maravilhosa, inteligente, digno, talentoso, enfim, suas qualidades são tantas que poderia ficar escrevendo o dia inteiro.
Obrigada por ter escrito uma parte da minha história, e por ter torcido por mim em todas as minhas vitórias e por ter acreditado em mim. TE AMO DEMAIS TIO / PADRINHO / AMIGO.
Sentirei saudade mas sei que estará olhando por nós aqui

  
Olivia Aguiar – 08.09.2014 


Venho a todos os meus familiares e amigos notificar a partida de meu irmão William Aguiar para a morada de nosso pai...agradeço a todos que pediram, rezaram...a oração liberta o espírito. .que tenhamos em nossos corações um sentimento de liberdade. ..tenho certeza ,que era o que ele mais prezava em sua vida. Não temos mais angústias e sim esperança porque Deus prepara o melhor caminho.Obrigado a todos. .A mão que te segura meu mano neste momento é a do Seu Pai...Oxalá te cubra de luzes....te amo menino maluquinho. ..




Carlos Passarelli – 09.09.2014


William era alguém que aparecia e sumia da minha vida, para depois tornar a aparecer. Era, de fato, uma aparição. Conheci-o na época da criação do núcleo de gays e lésbicas do PT, brigando e se irritando com o machismo e a homofobia que reinava em alguns setores do PT (ainda reinam, infelizmente). Depois ele sumiu e apareceu junto a pessoas com quem andava a fazer teatro. Quando alguém some a gente diz que foi para Portugal. Ele, de fato foi, e vim a re-encontrá-lo em Brasília. Já mostrava sinais da doença, mas estava sempre sorrindo e debulhando sua irreverência. Com ele eu entendi o que era a militància Política, com P maiúsculo. E com ele eu também aprendi os males de qualquer forma de fundamentalismo. Ele sempre me falava de suas crenças religiosas, sem nunca querer me impor nada. Ele respeitava a diferença, mas tinha tolerância zero com a ignorância. Eu fico feliz que seu sofrimento tenha chegado ao fim. Mas eu fico triste em saber que nunca mais eu vou virar uma esquina e ver aquela aparição, me assombrando de alegria e carinho. Fica somente a certeza que ele está fazendo seus ritos por nós, pois ele vivia para os outros. Tchau, meu irmão. Fica em paz...






Lula Ramires – 09.09.2014



Acho fundamental prestarmos homenagem a William. Pessoalmente, devo a ele minha trajetória primeiramente no Núcleo de Gays e Lésbicas (NGL) do PT municipal de São Paulo, o que me levou depois ao Corsa e ao atual Setorial LGBT do nosso partido. Em 1993, eu vi o William no programa do Sergio Groisman na TV. Era um programa de auditório, no SBT, ao vivo, com uma galera jovem fazendo perguntas. William foi falar sobre homossexualidade, sobre política, sobre a necessidade de combater a homofobia na sociedade brasileira. Fiquei encantado com suas palavras, com sua clareza, com sua garra, com sua postura combativa. Um ano antes, em 1992, eu voltava de Londres onde tinha morado por 10 meses e conhecido o movimento organizado de lá: havia grupos em vários bairros da capital inglesa, havia jornais gays distribuídos gratuitamente e que eram super politizados, havia uma infinidade de bares, havia as manifestações de protesto (beijaços inclusive) organizados pelo Act Up. E eu me perguntava se havia, no Brasil, vida gay inteligente... Eu havia participado dos encontros de um grupo chamado Gay Young London. E tudo isso serviu de base e inspiração para muitas coisas que eu vim a fazer aqui, anos depois. Mas destaco a importância que aquela entrevista do William teve na minha vida e que foi a centelha que me trouxe para a militância LGBT, da qual muito me orgulho de pertencer. Não cheguei a conhecer o William nesta época porque ele se mudara para Portugal e lá militava na luta contra o racismo. Só vim a conhecê-lo 7 anos depois, em 2000, numa das históricas Plenárias Nacionais LGBT do Partido dos Trabalhadores, realizadas anualmente em São Paulo, por ocasião da nossa Parada. Ele se emocionou quando eu falei da influência que ele teve na minha vida! Em seguida, passei a integrar o grupo assessor HSH do então Programa Nacional de DST/Aids, do Ministério da Saúde. Como o William morava perto do local das reuniões, invariavelmente ficava hospedado na casa dele, onde conversávamos sobre tudo: as contradições do movimento LGBT, a conjuntura política, a vida, a morte, a filosofia... Foi o William quem descortinou para mim os bastidores de Brasília, ainda na era FHC. Gosto de pensar que, sem nossos antecessores, não somos absolutamente nada. Deram-nos a vida, fisicamente, ou abriram – com muito esforço e sacrifício - as estradas onde hoje transitamos com passo firme. Não fosse pelo William, estaríamos atrasados em nossa luta por dignidade, direitos e políticas públicas. Seu falecimento nos deixa um vazio, que só poderá ser preenchido fazendo jus à sua memória e prosseguindo na caminhada da qual ele foi um dos precursores no Brasil. WILLIAM AGUIAR, PRESENTE!





Guilherme Cavalcante - 09.09.2014 

Toda amizade tem seus altos e baixos. Não sei se foi só comigo, mas minha relação com o Bill é (sim, sempre no presente, pois jamais findará) assim. Já tivemos muitas discussões sérias, brigas, desentendimentos, barraquinhos e barracões. Já vi esse fofo rodar a baiana muitas vezes, principalmente nos Facebooks da vida. E eu acho que exatamente por isso que gosto dele, neste plano ou nos outros, porque sua experiência de vida o obrigou a ser sempre uma pessoa muito honesta. O mundo precisa de honestidade.

Ultimamente, era a quem eu recorria por conta dos meus dramas existenciais, digamos assim, desde meus contragostos com a militância do meu estado como algumas situações que envolveram minha saúde, família, namorado, etc. O Bill sempre foi muito direto para dizer o que pensa e naquele momento eu precisava de realidade, de pé no chão. Conversávamos sobre amor, viadagens, candomblé, política, viagens, jornalismo, sempre dando pinta, muita pinta, quilos e quilos de purpurina.

Por não ter papas na língua, o William certamente deve ter afastado muita gente dele. Seleção natural. Eu, no entanto, o observava com admiração. Numa dessas madrugadas passamos horas conversando, eu atentamente assimilava sua história de militância. Por muitas vezes intencionei trazê-lo a MS para reuniões de formação política. Infelizmente nunca deu certo.

Até que um dia soube por ele mesmo de suas condições de saúde. Em agosto, quando houve a piora do Bill, conversei com o Beto de Jesus para saber se era ok eu falar com ele por telefone. Cheio de ressalvas (“só conversem amenidades, ele está em situação gravíssima”), consegui falar no celular dele. Ele tomava suco de melancia e eu disse que era incrível como mesmo acamada “essa bee não deixa de ser fresca”. Rimos. Aliás, rimos muito. Até que foi preciso me despedir para que ele descansasse. Sabia que aquele seria nossa última conversa e ao desligar o celular desabei a chorar. Culpa, eu acho.

Em junho estive em São Paulo e parei em frende a casa dele, na Alameda Barros. Liguei em seu telefone e ele disse: “querido, não se assuste, mas estou no hospital”. Não me assustei, fui procurá-lo no hospital, mas era meu último dia em São Paulo e eu não estava no horário de visitas. Não insisti. Deveria ter feito isso. Não pude dar um abraço no meu amigo. A culpa vem daí.

Sei que ele sabe, mas tenho muita gratidão por tê-lo conhecido. No coletivo Nosso Projeto (que reuniu muita gente legal, como o Caio Varela, Gleides Simone, Simone Florindo, Raphael Valente, Kátia Guimarães, dentre outros), conseguimos realizar ações muito bacanas na Internet. Com o Bill, tive a melhor dimensão do que é ser militante LGBT e o que é levar isso nas costas. Com ele aprendi muito, não só a levar o assunto a sério, mas as delícias de ser “bicha”, como ele mesmo dizia. Aprendi com ele a ressignificar palavras. Aprendi a reconhecer meus amigos de verdade. Aprendi que nesse mundo de opressão é fundamental se posicionar. Não tenho palavras para agradecer a esse tal de destino por ter-nos colocado na mesma estrada por algum tempo.
Meu amigo, tenho a certeza do nosso reencontro. Muitas saudades e admiração sempre. Amo você.





Clau Monteiro - 09.09.2014 


Fizeste arte,
vais agora, errante, colorir outros mundos,
com tua força, tua acidez, tuas virtudes,
vai amigo querido,
saudar um outro mundo,
vai em paz, siga teu caminho,
aprendizes que somos,
descanse agora,
vai menino passarinho,
ficamos nós aqui com saudades...



Caio Varella - 09.09.2014 



William foi um grande amigo, um irmão. Sorriamos, brigávamos, aprendíamos, fofocávamos, discutiamos, construímos, nos xingávamos, chorávamos juntos. 

Tive o prazer de conhecer a bee há mais ou menos 17 anos ainda em Sampa. Irriquieto, rápido, radical naquilo que acreditava, William causava admiração , respeito, raiva (dxs invejosxs) e provocava na gente aquela vontade de ir mais além, de aprender mais, de ampliar a mente e as possibilidades que a vida nos oferece. 

Ele me ensinou muito, me corrigiu, me fez pensar duas , três , quatro vezes. Me fez voltar atrás, reconhecer erros e crescer. Acho que esse é o melhor verbo, crescer, a Bonytah fazia com que todas as pessoas que estivessem ao seu lado crescessem. E euzinho fui um desses privilegiados. Antes de minha mudança para Buenos Aires, estávamos muito próximos, pude acompanhar a coragem, a garra e a hombridade com as quais William enfrentou o câncer, o HIV e as mazelas políticas de um partido que mudou demais e pra pior, segundo ele mesmo. 

Pude acompanhar a revolta de William ao ver as políticas LGBTs rifadas num jogo político que ceifa vidas. Sua indignação com o movimento era algo que o fazia gritar e seguir em frente. Em nossa ultima conversa virtual ele me falava de sua vontade de fazer mestrado na UFPA, de estar perto de seus familiares sanguineos, de poder da aula (como se ele não fizesse isso o tempo todo), de se livrar do caos de Sampa e das baixarias de Brasília. 

Ele me falou do tratamento doloroso e de sua dificuldade em dormir. Mas com toda sua força me disse: “Se eu sair de tudo isso, vou aí te visitar, e vamos rir juntos”. O finalzinho da nossa conversa foi sobre os gays reacionários que votam e fazem campanha pra Marina. 

Ele me comentava quão triste ver o caminho de nossa política tomou. Sua ultima frase foi: “Deu uma pequena porrada”, se referindo ao Coió que acabara de dar numa dessas bees. Eu sorri, pois vi a frase saindo de sua boca, escutei o som de sua voz. Infelizmente, não pude dizer obrigado por compartilhar tantos momentos lindos juntos. A bee descansou. Sentirei muita saudade, mas seguirei com a revolta (algo que sempre tivemos em comum) na luta por dias melhores. No próximo finde, vou a um lugar aqui que ele gostava muito , me sentarei e tomarei um bom vinho em sua homenagem , e claro vou (vamos) rir muito. Obrigado irmão querido! #umbeijoprastravestys